Wednesday, 20 February 2008

Santana Castilho (Professor Ensino Superior)

CARTA ABERTA AO ENGº José Sócrates.

Esta é a terceira carta que lhe dirijo. As duas primeiras motivadas por um convite que formulou mas não honrou, ficaram descortesmente sem resposta. A forma escolhida para a presente é obviamente retórica e assenta NUM DIREITO QUE O SENHOR AINDA NÃO ELIMINOU: o de manifestar publicamente indignação perante a mentira e as opções injustas e erradas da governação.
Por acção e omissão, o Senhor deu uma boa achega à ideia, que ultimamente ganhou forma na sociedade portuguesa, segundo a qual os funcionários públicos seriam os responsáveis pelo descalabro das contas do Estado e pelos malefícios da nossa economia.
Sendo a administração pública a própria imagem do Estado junto do cidadão comum, é quase masoquista o seu comportamento.
Desminta, se puder, o que passo a afirmar:
1º Do Statics in Focus nº 41/2004, produzido pelo departamento oficial de estatísticas da União Europeia, retira-se que a despesa portuguesa com os salários e benefícios sociais dos funcionários públicos é inferior à mesma despesa média dos restantes países da Zona Euro.
2º Outra publicação da Comissão Europeia, LÉmploi en Europe 2003, permite comparar
a percentagem dos empregados do Estado em relação à totalidade dos empregados de cada país da Europa dos 12. E o que vemos? Que em média nessa Europa 25,6 % dos empregados são empregados do Estado, enquanto em Portugal essa percentagem é de apenas 18%. Ou seja a mais baixa dos 12 países, com excepção da Espanha.
A rica Dinamarca e Suécia têm quase o dobro, respectivamente 32 e 32,6%. Se fosse directa a relação entre o peso da administração pública e o défice, como estaria o défice destes dois países.
Um dos slogans mais usados é o peso das despesas da saúde. A insuspeita OCDE diz que na Europa dos 15 o gasto médio por habitante é de 1458. Em Portugal é de 758.
Todos os restantes países, com excepção da Grécia, gastam mais que nós. A França 2730, a Áustria 2139, a Irlanda 1688, a Finlândia 1539, a Dinamarca 1799,etc.
Com o anterior não pretendo dizer que a administração pública é um poço de virtudes. Não é. Presta serviços que não justificam o dinheiro que consome. Particularmente na saúde, na educação e na justiça. È um santuário de burocracia, de ineficiência e de ineficácia. Ma infelizmente os mesmos paradigmas são transferíveis para o sector privado. Donde a questão não reside no maniqueísmo em que o Senhor e o seu ministro
das Finanças caíram, lançando um perigoso anátema sobre o funcionalismo público.
A questão reside em corrigir o que está mal, seja público, seja privado. A questão reside em fazer escolhas acertadas. O Senhor optou pelas piores. De entre muitas razões que o espaço não permite, deixe-me que lhe aponte duas:
1º Sobre o sistema de reformas dos funcionários públicos têm-se dito barbaridades.
Como é sabido, a taxa social sobre os salários cifra-se em 34,75% (11% pagos pelo trabalhador, 23,75% pagos pelo patrão).
OS FUNCIONÀRIOS PÚBLICOS PAGAM OS SEUS 11%.
Mas O SEU PATRÃO ESTADO NÃO ENTREGA MENSALMENTE À CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, COMO LHE COMPETIA E EXIGE AOS DEMAIS EMPREGADORES, os seus 23,75%. E é assim que as “transferências” orçamentais assumem perante a opinião pública não esclarecida o odioso de serem formas de sugar os dinheiros públicos.
Por outro lado, todos os funcionários públicos que entraram ao serviço em Setembro de 1993 já verão a sua reforma ser calculada segundo os critérios aplicados aos restantes portugueses. Estamos a falar de quase metade dos activos. E o sistema estabilizará nessa base um pouco mais de uma década.
Mas o seu pior erro, Senhor Engenheiro, foi ter escolhido para artífice das iniquidades que subjazem à sua política o ministro Campos e Cunha, que não teve pruridos políticos
morais ou éticos por acumular os seus 7000 euros de salário, os 8000 de uma reforma conseguida aos 49 anos de idade e com 6 anos de serviço. E com a agravante de a obscena decisão legal que a suporta ter origem numa proposta de um colégio de que o próprio fazia parte.
2º Quando escolheu aumentar os impostos viu o défice e ignorou a economia. Foi ao arrepio do que se passa na Europa. A Finlândia dos seus encantos, baixou-os em 4 pontos percentuais, a Suécia em 3,3 e a Alemanha em 3,2.
3º Por outro lado, fala em austeridade de cátedra, e é apologista juntamente com o presidente da Câmara Municipal de Viana do Castelo, da implosão de uma torre (Prédio Coutinho) 0nde vivem mais de 300 pessoas.
Quanto vão custar essas indemnizações, mais a indemnização milionária que pede o arquitecto que a construiu, além do derrube em si?
4º Porque não defende V. Exa. a mesma implosão de uma outra torre, na Covilhã (ver Correio da Manhã de 17/10/2005), em tempos defendida pela Câmara e que agora já não vai abaixo?
Será porque o autor do projecto é o Arquitecto Fernando Pinto de Sousa, por acaso pai do Senhor Engenheiro Primeiro-ministro deste país?
Porque não optou por cobrar os 3,2 mil milhões de Euros que as empresas privadas devem à Segurança Social?
Porque não pôs em prática um plano para fazer a execução das dívidas fiscais pendentes nos tribunais e que somam 20 mil milhões de euros?
Porque não actuou ao lado dos benefícios fiscais que em 2004 significaram 1000 milhões de euros?
Porque não modificou o quadro legal que permite aos bancos, que duplicaram lucros em época recessiva pagar apenas 13% de impostos?
Porque não renovou a famigerada Reserva Fiscal de Investimento que permitiu à PT não pagar impostos pelos prejuízos que teve no Brasil, o que, por junto representará cerca de 6500 milhões de euros de receita perdida?

A verdade e a coragem foram atributos que V. Exa. Invocou para se diferenciar dos seus opositores.

Quando subiu os impostos que perante milhões de portugueses garantiu que não subiria, ficamos todos esclarecidos sobre a verdade.

Quando elegeu os desempregados, os reformados e os funcionários públicos como principais instrumentos de combate ao défice, percebemos de que teor é a sua coragem.

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